EXERCÍCIOS DE REDAÇÃO
O GLOBO
BLOG DO NOBLAT - 16/10
Pode um juiz usar o poder da toga para escrever um despacho sem se ater ao
objeto do processo que lhe chega às mãos, usando o espaço para se engajar na
ação corporativa da Associação de Magistrados a que pertence?
E mais: tem o direito de fazer nesse mesmo recurso prejulgamento sobre matérias
que fogem à sua competência, como projetos de lei e PECs?
É evidente que não. Porém isso é o que se lê num despacho exarado em 3 de
outubro passado por um juiz de uma Vara de Trabalho do TRT da 2ª Região. O
reclamante, que deve ter atravessado um calvário para marcar uma audiência no
dia 5 de outubro, ficou a ver navios ao ver o adiamento para o final de junho
de 2017. A razão: o juiz aderiu ao movimento nacional de paralisação de
atividades deliberado por uma Assembleia de Magistrados.
Cumpriu Sua Excelência o dever de fazer Justiça? Tinha direito de parar o múnus
judiciário para atender ao movimento corporativista?
Entre as considerações descritas no despacho, o juiz alega “fragilização de
ações institucionais de combate à corrupção”, posicionando-se, ainda, contrário
à PEC 241, “que afronta direitos sociais e ataca garantias constitucionais” e
assim por diante. Distribuiu juízos de valor no despacho, mas nada disse sobre
o processo do reclamante.
Ora, juiz não pode fazer prejulgamento. Por mais que se aceite a tese de que
juiz é também cidadão – podendo nessa condição expressar livre pensamento – ao
magistrado, no exercício da função, impõe-se rigor ético, não podendo antecipar
seu ponto de vista sob pena de causar suspeição.
1 Escreva em um parágrafo de, no máximo 5 linhas, quais foram os erros do juiz.
2 ''O reclamante, que deve ter atravessado um calvário para marcar uma audiência no dia 5 de outubro, ficou a ver navios ao ver o adiamento para o final de junho de 2017''.
Substitua as expressões sublinhadas, aí em função poética da linguagem ( conotação) por outras que sejam objetivas ( denotação)
O ativismo judicial
O juiz, ensina Francis Bacon, filósofo inglês, deve ser reverendo e sutil.
Ater-se à missão de administrar a justiça. Não é o que vemos. Daí a recorrente
observação: há muitos juízes que driblam os princípios que regem a
magistratura.
Multiplicam-se as ações de cunho corporativista empreendidas por associações de
magistrados e outros operadores do Direito que entram na arena política
brandindo armas flamejantes.
A radiografia mostra um amplo aparato judiciário imbricando-se no território da
política. Ou seja, o campo da política passa a dividir espaço com a seara da
justiça. A imbricação é tão patente que já ganhou conceitos muito conhecidos:
judicialização da política e politização da justiça.
3 Defina em sucintas palavras:
1 judicialização da política
2 politização da justiça
O chamado “ativismo judicial” tem algumas explicações: o despertar da
sociedade, por meio de seus núcleos organizados; a emergência de novos polos de
poder; a promoção da cidadania, na esteira das bandeiras dos direitos humanos e
da igualdade, responsável por movimentos como os de defesa das mulheres, de
etnias e dos homossexuais; e o vácuo proporcionado pela ausência de legislação
infraconstitucional (muitos dispositivos da CF de 88 não foram regulamentados).
Nesse ambiente de múltiplas interações, dentro do qual convivem instituições em
processo de consolidação e uma cultura patrimonialista que subjuga a res
publica ao crivo (e à ambição) do interesse privado, é difícil ao sistema
judiciário tornar-se imune às pressões políticas.
Explique sucintamente o motivo de o poder judiciário ter-se ligado à política.
A resposta está no texto. Mas, além de analisar se respondeu correto, quero ver a objetividade na escritura.
A partir de 88, a Carta Magna abriu o leque de relações mais intensas. A
composição das Cortes, por sua vez, tem proporcionado íntima conexão entre
justiça e política. Veja-se o processo de seleção de nomes para compor listas
dos tribunais superiores, encaminhadas ao chefe do Executivo, a quem cabe a
palavra final.
No torneio de trancas e retrancas, pressões e contrapressões, há jogadores dos
partidos, de arenas corporativas (associações de classe) e de grupos.
Registre-se, ainda, que o território dos negócios adentrou os domínios do
Estado. Portanto, a politização da justiça sob o prisma de indicação de nomes para
as Cortes incorpora esse componente.
''A partir de 88, a Carta Magna abriu o leque de relações mais intensa''
Explique brevemente o que são essas relações mais intensas. Utilize ideias do próprio período.
Em nações desenvolvidas, como a França e a Alemanha, isso é até natural.
Parcela da Corte Constitucional passa pelo crivo do Parlamento. Há, ali,
intenso atrelamento partidário. Nos Estados Unidos, a nomeação de magistrados
também passa pela régua partidária, seja privilegiando democratas ou
republicanos (liberais ou conservadores), dependendo do presidente do momento.
Por aqui, é comum se ouvir: “o juiz fulano é ligado ao político beltrano e
vice-versa, o mandatário tem afinidade com o juiz tal”. O desenho ganha matiz
mais forte quando a aproximação gera suspeita, quando se escancara a influência
de atores (políticos/empresariais) nas decisões judiciárias.
As curvas acabam batendo às portas do Conselho Nacional de Justiça. Emerge a
velha questão:Quis custodiet custodes? Quem vigia o vigilante? Norberto Bobbio
sugere resposta ao pressupor que a indagação, per si, aponta para um vigilante
superior. Portanto, aquele Conselho precisa ser um atento vigilante para evitar
juízes caminhando por linhas tortas.
A prevalência da coisa acordada
Atente-se, ainda, para o exagero cometido por certas instâncias do Judiciário.
Examinemos a questão da prevalência da autonomia coletiva (negociação entre
patrões e empregados) sobre a legislação.
O STF, por meio de alguns de seus ministros, se pronunciou sobre a força da
coisa acordada sobre a coisa legislada. Mas o Tribunal Superior do Trabalho
entende que o princípio da autonomia deve ser “relativizado”, não podendo ser
aplicado a todos os direitos que os trabalhadores detêm.
Alguns membros do TST questionam a natureza jurídica do “negociado”, alegando
que os precedentes do STF sobre a matéria (negociado X legislado) têm sido
pontuais, não podendo se estender indiscriminadamente a toda a pletora de
direitos e tipos de negociação.
O TST fecha a questão: a Justiça do Trabalho é quem deve avaliar o que pode ou
não ser negociado. E levanta a dúvida: ministros do TST podem julgar em
contrário ao entendimento da Suprema Corte?
O fato é a Corte do Trabalho parece defender a manutenção de um estado cada vez
mais conflituoso na sociedade. A lógica: quanto mais conflito mais poder
deterá. A recíproca é verdadeira. Não por acaso, os altos juízes do trabalho
dão a impressão de que também apreciam legislar, extrapolando a função que lhe
compete, a de distribuir justiça.